Medicina Pan Vascular – uma nova estratégia na prevenção e tratamento da doença aterosclerótica
publicado em Notícias
07/05/2025
As doenças cardiovasculares continuam a ser a principal causa de morte no mundo, e Portugal não é exceção. Em artigo de opinião, o Dr. Mário Espiga de Macedo defende uma mudança urgente de paradigma na abordagem à doença aterosclerótica, propondo o conceito de “Medicina Pan Vascular” como estratégia essencial para a prevenção e o tratamento eficaz destas patologias. Saiba mais.
As doenças cardiovasculares (DCV), principalmente o enfarte agudo do miocárdio e o acidente vascular cerebral, continuam a ser em 2025 as principais causas de morte e de doença em todo o mundo, sendo a causa de mais de um terço das mortes. Vários são os estudos que nos revelam que o controlo da prevalência de alguns dos principais fatores de risco vasculares (hipertensão arterial, dislipidemia, diabetes , obesidade, tabaco. etc), estagnou ou até se agravou, contribuindo para o elevado número de mortes prematuras. Há por isso uma falha dos médicos e das entidades responsáveis na prevenção das doenças vasculares e no tratamento precoce dos sinais subclínicos das doenças ateroscleróticas. Também em Portugal, apesar de haver alguma melhoria no controlo destas doenças, ainda estamos longe dos objetivos ideais da sua prevenção e da melhoria dos fatores de risco com elas relacionados. Estão os médicos demasiadamente focados no processo isquémico agudo, que quando acontece, já é tarde para uma ótima intervenção, e limitam a eficácia do tratamento.
Uma das razões desta situação são o aparecimento de fatores de risco emergentes, nem sempre valorizados pelos médicos, como o aumento muito significativo da diabetes e em idades mais precoces, a epidemia da obesidade em todos os grupos etário, mas principalmente em idades muito precoces, as nano partículas de plásticos, os problemas socioeconómicos, o consumo de álcool, a poluição atmosférica, a poluição sonora, o stress profissional e familiar, a adoção de estilos de vida pouco saudáveis, o sedentarismo, e a história familiar de doenças vasculares nem sempre lembrada.
Classicamente, só nos lembramos da doença vascular quando existe um evento agudo, enfarte do miocárdio, acidente vascular cerebral, claudicação dos membros, aneurisma da aorta, etc., que são normalmente tratados pelo especialista da área em questão, cardiologista, neurologista, que pensa na base de uma oclusão arterial e esta orienta o diagnóstico e tratamento, esquecendo-se, muitas das vezes, do continuum sistémico da aterosclerose. Ora, na grande maioria das ocasiões trata-se o evento agudo, esquecendo-se que a doença vascular pode existir em todo o território arterial. Estudos recentes mostraram que em doentes com enfarte do miocárdio, existia doença arterial periférica em mais de 60 %. O conceito de medicina pan vascular parte de uma perspetiva holística da estrutura e função do corpo humano e explora os mecanismos que geram e fazem progredir a doença aterosclerótica através de uma abordagem multidimensional dos sistemas biológicos.
É do conhecimento de todos que a aterosclerose se desenvolve desde a infância e que se vai agravando ao longo da vida, até haver um evento agudo. Este desenvolvimento é tanto maior quanto mais fatores de risco e mais graves possuir o paciente.
A estratégia de avaliação e tratamento das doenças pan vasculares deve deixar de estar centrada na doença, mas centrada no doente (ateroma). Deve haver uma conjugação de estudos entre a medicina, a biologia e as novas tecnologias. A identificação da presença de alguns dos vários fatores de risco já acima referidos e o seu controlo contribuem para a prevenção e redução das incidências das doenças vasculares. É fundamental a deteção e prevenção precoce da doença. Não devemos esquecer que a doença aterosclerótica e a sua placa por vezes instável, e com irregularidades, se distribui ao longo de toda a árvore vascular, e se desenvolvem precocemente desde a idade jovem e ao logo da vida, sendo aí que devemos focar a nossa atuação no sentido do precoce diagnóstico e tratamento, evitando desse modo um evento agudo.
São múltiplos os instrumentos à nossa disposição, como as diferentes multi-omics que permitem a identificação de biomarcadores que ajudam na melhor compreensão do e avaliação do risco antes de acontecer um evento vascular. A ultrassonografia complementada pela tomografia computorizada e a angioressonância permitem conhecer bem as lesões de toda a arvore vascular. Como é bem conhecido a inflamação e a atividade imunológica, estão na base do processo fisiopatológico da aterosclerose e da instabilidade das placas, podendo aqui o PET/TC ser um ótimo instrumento de diagnóstico. Contudo estas novas tecnologias ainda não estão disponíveis para toda a população, pois têm a maioria delas um custo elevado.
Devemos por isso estar atentos aos marcadores subclínicos e aos perfis fenotípicos que nos podem por no caminho de um diagnóstico precoce. Mas se estivermos atentos aos novos fatores de risco CV emergentes, tratarmos e controlarmos bem a hipertensão (continua a ser o principal fator de risco das DCV) a dislipidemia, e vencermos a epidemia da obesidade principalmente nos jovens, e ainda a diabetes, vamos conseguir uma redução de mais de 50 % dos eventos cardiovasculares principalmente os em idades precoces.
Aconselho a leitura da publicação muito recente, de maio de 2025 : The European Cardiovascular Health Plan: The Roadmap – publicada pela European Alliance for Cardiovascular Health, que é uma magnifica recomendação e orientação para todos os que queira estar na luta contra as doenças pan vasculares, com o fim como é proposto nesta publicação de conseguir uma redução de 30 % das DCV até 2030.