Stress e longas horas de trabalho
publicado em Notícias
22/08/2024
As doenças cardiovasculares (DCV) são a principal causa de morte em todo o mundo, sendo responsáveis por mais de 18,6 milhões de mortes por ano.1,2
Daqui se depreende a importância de conhecer e controlar todos os fatores precipitantes e agravantes desta doença, inclusive os fatores psicossociais. Contudo, compreende-se que a medição deste tipo de fatores não é simples, tendo em conta a sua variabilidade de acordo com a duração da resposta emocional, a altura de vida do acontecimento e a causa deste, bem como, das características do sujeito (idade, inteligência, exposição anterior ao trauma e disfunção psiquiátrica pré-existente). Apesar dessas limitações, atualmente, já não se contesta a importância do stress agudo como precipitante de eventos cardiovasculares (ECV) nem do stress crónico como fator iniciador de patologia aterosclerótica e cardiovascular. De facto, o stress (agudo ou crónico), consiste num desafio orgânico de relevo, ativando respostas biológicas endógenas que se podem associar a uma maior progressão e/ou progressão mais rápida do processo aterosclerótico e a uma maior incidência de ECV. O conhecimento crescente sobre a fisiopatologia do stress permite-nos entender a sua relação com os fatores de risco cardiovasculares mais comuns, as suas consequências físicas, emocionais e comportamentais e “abre portas” a intervenções terapêuticas baseadas em evidência.
Relativamente aos fatores de stress crónico é de salientar o decorrente da atividade profissional.
De acordo com estudos recentes, Portugal é considerado o país da União Europeia com maior risco de ocorrência de burnout 4. Como agravante, o impacto da pandemia por SARS-Cov2 e a realidade do teletrabalho como consequência desta crise de saúde pública, provocaram ainda mais sintomas de ansiedade, perturbações do sono e stress, levando a uma maior prevalência de situações desta natureza que aumentam o risco de ECV.
Em 2021, foi publicado, na revista científica Environmental International 5, o primeiro estudo global sobre os efeitos dos horários excessivos na saúde dos trabalhadores, a Organização Mundial de Saúde e a Organização Internacional do Trabalho concluíram que trabalhar 55 ou mais horas por semana aumenta em 35 % o risco de morte por acidentes vasculares cerebrais (AVC) e em 17 % por doença cardíaca, em comparação com uma semana de trabalho de 35 a 40 horas. Numa altura em que a pandemia veio mudar profundamente o mundo laboral, os especialistas alertam para um aumento dos riscos associados às longas horas de trabalho e apelam à adoção de uma legislação que limite a carga horária.
Posso concluir, dizendo que, a relação entre stress e DCV, incita a busca de novas intervenções terapêuticas e sociais de modo a minimizar estes riscos.
Dr.ª Patrícia Vasconcelos
Especialista em Medicina Interna
REFERÊNCIAS:
1 – World Heart Federation. About World Heart Day [Internet]. 2022. Disponível em: https://world-heart-federation.org/world-heart-day/about-whd/
2 – World Health Organization. Cardiovascular Diseases (CVDs) [Internet]. 2021. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/cardiovascular-diseases-(cvds)
3 – Eller NH, Netterstrom B, Gyntelberg F, et al. Work-related psychosocial factors and the development of ischemic heart disease: a systematic review. Cardiol Rev. 2009 Mar-Apr; 17(2):83-97.
4 – https://smallbusinessprices.co.uk/european-employee-burnout/
5 – Pega F, Náfrádi B, Momen NC et al. Global, regional, and national burdens of ischemic heart disease and stroke attributable to exposure to long working hours for 194 countries, 2000-2016: A systematic analysis from the WHO/ILO Joint Estimates of the Work-related Burden of Disease and Injury. Environ Int. 2021 Sep;154:106595.